15/04/13

Jovem e maior grupo de endividados

Entre as ambições para a construção de uma carreira, os pequenos luxos do cotidiano e os momentos de lazer, os jovens são grandes consumidores de produtos e serviços. Não são raros os meses em que o salário não alcança a soma ansiedade + ambição + estímulo pelo consumo + crédito fácil.

O resultado é que o maior índice de pessoas com dívidas em atraso – 38,28% – está na faixa entre 16 e 20 anos, conforme a Câmara de Dirigentes Lojistas (CDL) de Porto Alegre com base em dados do Serviço Central de Proteção ao Crédito (SCPC). O início da vida financeira conturbado se acentuou com o maior acesso à tecnologia, avalia o diretor executivo da CDL, Ricardo Guimarães:

– Começou a partir do momento que teve o boom da telefonia celular.

São novidades que atraem os olhos de quem ainda não aprendeu a lidar com orçamento limitado. Novos smartphones, tablets ou carros. Roupas mais bonitas, de grifes. Viagens para lugares distantes. Games viciantes que exigem consoles potentes. Ter coisas enturma, faz o jovem se sentir poderoso e bem-sucedido. São alguns dos motivos que geram o consumo desenfreado, diz a professora de ciências do consumo aplicado da ESPM e consultora na área, Suzana Carvalho:

– Atualmente, o dinheiro tem muito mais importância na vida das pessoas do que anos atrás, e o estímulo ao consumo é grande.

Hoje, Dia do Consumidor, a presidente Dilma Rousseff anuncia medidas para modernizar as relações de consumo no Brasil. Não conseguir pagar as contas em dia é comum a milhares de pessoas. Apesar da queda pelo quarto mês seguido, o número de brasileiros que não quitaram dívidas em fevereiro foi 10,1% maior que no mesmo mês de 2012, segundo a Serasa Experian. No Estado, o índice cresceu 4% em janeiro em relação a dezembro.

A grande oferta de crédito é outro fator destacado por especialistas como vilão na busca pela saúde financeira. Se a posse de objetos é valorizada, os números que transitam entre uma conta e outra parecem não fazer mais sentido, mesmo quando surgem naquele temido tom avermelhado na tela do caixa eletrônico.

– Quem entra na faculdade ganha de bancos conta corrente e cartão, mesmo não tendo renda nem patrimônio. Você junta a falta de educação financeira com exacerbação do consumo e acesso a crédito, já viu – diz o economista Samy Dana, professor de administração e finanças da FGV.

Juro se torna bola de neve

Não saber como funcionam as taxas de juro e os riscos de comprometer uma parte grande demais do orçamento em prestações compõem o bolo da inadimplência entre jovens.

A situação só melhora com o tempo. Em fevereiro, o índice na faixa de 21 a 25 anos foi de 21,19%, e de 26 a 30, 14,43%. Davis Schroetter, 29 anos, estudante de Ciência da Computação na PUCRS, não tem grandes contas fixas para pagar, mas já sabe o peso de errar na programação financeira.

– Eu gastava quatro ou cinco vezes mais do que recebia com festas e compras. A minha última dívida chegou a cerca de R$ 10 mil. Fiz um financiamento no banco do cartão, paguei ainda mais juro, parcelei a dívida em 15 vezes e consegui quitar. Mas foi a última vez que me descontrolei – afirma, agora mais controlado e dono de uma conta de poupança.

Driele Cardoso, 21 anos, vai pagar no próximo mês a sexta e última fatura do parcelamento do cartão de crédito de uma loja de roupas. A estudante do curso técnico em Recursos Humanos acumulou dívidas durante meses, já que não conseguia liquidar as faturas mensais. Na época, o valor que ganhava como estagiária não era o suficiente para quitar os pagamentos. Enquanto o parcelamento não estiver pago, o cartão permanece bloqueado.

– Fiquei frustrada, não posso deixar acontecer isso de novo. Vou terminar de pagar e não usar mais cartão até que eu possa me estabilizar – diz Driele.

No vermelho
Inadimplentes de 16 a 30 anos no Estado:
Janeiro: 19,07%
Fevereiro: 24,8%
Alta de 3,55%

Índice de inadimplência no Estado por faixa etária:
16 a 20 anos: 38,28%
21 a 25 anos: 21,19%
26 e 30 anos: 14,43%

Fonte: SCPC

Educação começa cedo
O presidente da Associação Brasileira de Educadores Financeiros (Abefin), Reinaldo Domingos, explica que há projeto de tornar a educação financeira disciplina obrigatória no ensino regular. Mas a conversa já pode começar em casa. Confira como proceder:

3 a 5 anos
É recomendado presentear o filho com três cofrinhos, um de cada tamanho. No menor, vão as moedinhas destinadas a gastos de curto prazo e, assim, sucessivamente.
Domingos diz que os pais devem ensinar que os cofres guardam os sonhos de compras das crianças e que, para realizá-los, devem ter o hábito de economizar.

6 a 14 anos
A ideia é mostrar para o filho o que o dinheiro faz, como comprar coisas ou pagar contas. Então, se deve traçar planos de economizar para realizar os sonhos da família, como uma viagem de férias. Nessa idade, os pequenos já podem participar de reuniões em família para decidir no que se gasta. O especialista também aconselha ensinar a questão da escolha, que se deve optar por gastar as economias em uma ou outra compra.
Depois dos sete anos também é recomendado dar uma mesada. Para calcular o valor adequado, o especialista da Abefin faz uma conta: a quantidade ideal é metade do pedido (ou ganho) pelo filho em 30 dias. Isso vai fazer com que ele precise economizar para adquirir algo.

Acima dos 14 anos
Alguns jovens nessa faixa já começam a trabalhar e outros ganham mesada. Em ambos os casos há assédio por parte das empresas financeiras na oferta de crédito. Nesse caso, o ideal é começar dando um cartão pré-pago, para que o jovem entenda o tamanho da verba que tem disponível.
Ensinar sobre a possibilidade de guardar dinheiro para a aposentadoria pode ser útil para criar o hábito de poupar recursos.